Benefícios e Riscos do Celular na Infância

Os avanços tecnológicos surgem constantemente e nos surpreendem pela genialidade. Quando ainda estávamos maravilhados com a telefonia móvel tradicional, surgiram os primeiros aparelhos com tela sensível ao toque e apenas um botão físico — um verdadeiro divisor de águas em relação ao conceito que tínhamos desde a invenção do telefone. Logo em seguida, quando acreditávamos já ter alcançado um ponto máximo de inovação, surgiu a transferência de dados via 2,5G. Esse recurso transformou o celular em algo muito além de um instrumento de comunicação por voz: inaugurou-se uma nova concepção de mobilidade, que mais tarde receberia o nome de Internet das Coisas (IoT, do inglês Internet of Things).

É inegável que o celular trouxe agilidade a diversas tarefas cotidianas e se tornou uma ferramenta indispensável em praticamente todas as áreas da vida moderna. Se voltarmos à década de 1990, antes da popularização da telefonia móvel, nossa rotina era completamente diferente. Para pagar um boleto, era preciso ir até uma agência bancária. Muitas vezes, isso incluía procurar um táxi na rua e pagar a corrida em dinheiro. Hoje, com apenas alguns toques na tela, chamamos um carro por aplicativo, pedimos refeições, quitamos contas e realizamos transferências bancárias em minutos. A sociedade ganhou tempo e produtividade. Além disso, o celular nos permite registrar momentos em fotografias digitais armazenadas em nuvem, protegidas contra a degradação do tempo ou acidentes que comprometiam os antigos álbuns físicos.

Mas, como toda grande inovação, os ganhos vieram acompanhados de novas pressões sociais. A possibilidade de estar sempre conectado gerou cobranças implícitas: se não atendemos a uma ligação, frequentemente somos questionados — “por que não quis falar comigo?”. É importante ressaltar, porém, que o celular é um bem pessoal, e a decisão de atender ou não deve ser respeitada. Mesmo desligados, alguns aparelhos continuam emitindo sinal de localização via GPS, o que levanta preocupações sobre privacidade.

Na experiência da parentalidade, o celular também está presente em praticamente todos os momentos. Desde a gestação até o nascimento, registros são feitos com o aparelho. Já em casa, ele auxilia os pais com informações rápidas sobre cuidados iniciais, como massagem para cólicas ou dicas de sono do bebê. Mais adiante, diante do choro persistente da criança, muitos recorrem aos vídeos infantis nos dispositivos móveis. O efeito costuma ser imediato: a criança se acalma, fascinada pelo fluxo de cores e sons repetitivos das animações.

Com o tempo, esse uso tende a se intensificar. Aos cinco anos de idade, não é incomum que os pais, em vez de oferecerem livros, jogos de tabuleiro ou atividades manuais, acabem cedendo um aparelho mais antigo para a criança.

No meu caso, como pai de uma menina atualmente com 12 anos, que cresceu justamente nessa era digital, procurei sempre equilibrar o uso do celular com atividades lúdicas fora do ambiente tecnológico. Curiosamente, as atividades preferidas da minha filha são leitura, desenho e culinária. Nunca houve imposição; apenas apresentamos alternativas, e ela se interessou. Difícil dizer se tais escolhas foram fruto de predisposição pessoal ou estímulo familiar. O que é perceptível, no entanto, é que essa realidade é incomum. Entre os pais do grupo escolar, muitos relatam dificuldades em lidar com o tempo de tela dos filhos, que chegam a passar até dez horas por dia no celular. Quando tentam impor limites, enfrentam reações de irritação, dificuldade de concentração e baixo rendimento escolar.

Parece-me, como observador não especializado, que parte da juventude utiliza o celular como um funil para o qual direciona criatividade e emoções. Jogos e aplicativos, por sua vez, oferecem recompensas rápidas, semelhantes a pequenas doses de endorfina, que contribuem para manter crianças e adolescentes presos às telas.

Para aprofundar essa discussão, convidei a psicóloga Mariana Cavalheiro, psicoterapeuta de orientação psicanalítica, para compartilhar sua análise profissional sobre o tema:


Quando recebi o convite do Filipe para ajudá-lo a pensar e escrever sobre este tema, confesso que me desacomodou, me tirou da zona de conforto. Não costumo compartilhar meus pensamentos e textos para fora da minha “bolha”. Mas, diante da necessidade de falarmos sobre esse avanço tecnológico que, a cada dia, parece nos consumir um pouco mais, achei pertinente dividir algumas reflexões.

Ao usarem a IA para elaborar trabalhos escolares e acadêmicos, percebemos que os alunos reduzem a capacidade de pensar sobre o tema proposto e elaborar um texto a partir de suas próprias ideias. Mas não vejo isso como novidade: antes da IA, existia o Google, e bastava um clique para os alunos terem acesso a uma infinidade de informações (nem sempre corretas). A diferença é que, com a IA, o acesso ficou mais rápido e dinâmico. Basta fazer a pergunta certa, e a resposta surge em segundos. Com Google ou Wikipedia, era preciso abrir link por link, ler, selecionar o que era relevante e só então elaborar o trabalho. Não sejamos ingênuos: o “ctrl c + ctrl v” sempre existiu. Mas, ainda assim, era mais trabalhoso.

O que a IA oferece hoje é tempo. Otimização de tempo, com respostas diretas e eficazes (há controvérsias). Não há o processo de pensar, pesquisar, resumir e escrever.

E, ao refletir sobre essa otimização, me vem outra questão: o uso da IA como “psicólogo de bolso”. Será que realmente tem a mesma eficácia que conversar com um psicoterapeuta? Eu garanto que não. Onde fica o espaço para ser acolhido e compreendido de forma afetiva? Carl Jung certa vez disse: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.” A IA realmente sabe muito, mas ainda é incapaz de ser humana. O afeto, a sensibilidade e a presença — seja física ou mesmo virtual, no caso da psicoterapia online — ainda não podem ser substituídos (ufa!).

Mas por que tantas pessoas insistem em usá-la para esse fim? A primeira hipótese é a questão financeira: a IA é gratuita. Ainda assim, existem diversas clínicas, dentro e fora das universidades, que oferecem atendimento psicológico gratuito, além do SUS. Sim, o processo pode demorar mais do que os 10 segundos que a IA leva para responder. Mas qual o preço da saúde mental? A segunda hipótese, mais preocupante, é que talvez as pessoas não queiram se conhecer, não queiram olhar para as próprias feridas. Procuram soluções rápidas, fáceis, sem tempo a perder.

Um processo de psicoterapia pode ser longo, expõe traumas e feridas, é doloroso. E ninguém quer sofrer. O que se busca é cura, felicidade instantânea, amenização dos sintomas, bem-estar palpável — uma receita infalível que possa ser repetida com os mesmos resultados. Mas a vida não é linear. Ela nos atravessa com novas demandas e situações inesperadas. Nós evoluímos; a IA também. Será que algum dia ela nos alcançará?

(CAVALHEIRO, 2025).


Percebemos, assim, que as facilidades se multiplicam desde que a internet entrou em nosso cotidiano. A geração nascida nos anos 1980 era refém das bibliotecas. Nada era simples. A mente era exigida. A paciência era um conditio sine qua non para quem precisou sobreviver aos trabalhos escolares. Essa geração, da qual faço parte, saiu do telefone de pulso para o salto tecnológico dos smartphones. O pagamento de contas exigia a ida pessoal ao banco. Hoje, eu gasto o mesmo tempo para quitar todas as contas do mês que antes gastaria apenas para sair de casa e chegar ao ponto de ônibus ou de táxi. Meu objetivo com essa reflexão é demonstrar o quão satisfeito estou com a era atual.

Porém, assim como os aviões — que encurtam distâncias e realizam sonhos, mas também podem levar destruição sob suas asas —, a internet é exuberante em suas potencialidades. Cabe a nós, pais e mães, sermos a fronteira entre deixar uma criança hipnotizada por um celular, cujos efeitos ainda desconhecemos, ou instigá-la a realizar atividades que estimulem suas habilidades motoras.

Como bem ressalta a psicóloga Mariana, temos ao nosso alcance a IA, cujas maravilhas vêm sendo lapidadas de forma inexorável, dia após dia, como se fosse um esforço global na construção de uma nova Torre de Babel, destinada a unificar conhecimento. A IA nos oferece recomendações fantásticas sobre como deixar um texto mais formal ou mais descontraído, realizar correções ortográficas e de pontuação e até traduzi-lo para qualquer idioma. Mas, como Mariana bem pontua, uma IA jamais substituirá a sensibilidade humana. O acolhimento que um profissional de psicologia pode oferecer é algo que a máquina não consegue alcançar.

Concluo afirmando que sempre defenderei a causa do progresso tecnológico, desde que ele não destrua nossa essência. A máquina não conseguirá lançar um olhar de empatia, reproduzir uma expressão facial que demonstre afeto ou combiná-los com um sorriso, braços abertos e aquela sensação intangível de que somos bem-vindos.


Referências

CAVALHEIRO, Mariana. Psicoterapeuta de orientação psicanalítica. CRP 07/26766. Porto Alegre, 2025.
GONÇALVES, Filipe. Technical Customer Service Senior Manager. Porto Alegre, 2025.

✍️ Quer publicar seu artigo na ANETI?

Mostre sua voz e compartilhe seu conhecimento com mais de 1.500 profissionais de T.I. Faça parte ativa da nossa comunidade!

Clique Aqui

Artigos relacionados

Respostas